quarta-feira, novembro 02, 2005

Boatos e Intrigas

1. Todos já percebemos que José Sócrates não morre de amores por Coimbra. Este assunto, mal resolvido com a cidade que o acolheu enquanto estudante, só Freud eventualmente explicaría. E, por não se tratar de caso único e nunca visto, sería de toda a conveniência estudá-lo bem e melhor interpretá-lo. "Como é mais fácil deixar que as coisas não mudem, sermos o que sempre fomos, mudarmos apenas dentro de nós próprios?"
2. Não se trata de um boato que o governo tenha decidido que Coimbra sería, pelo menos no que dele dependesse, uma terra adiada. As obras que deveriam ter sido lançadas agora passaram para 2006. É o caso da Estação Velha, em situação que nos envergonha e que há seis meses está para ser adjudicada a sua remodelação. E da obra do Hospital Pediátrico que tem apenas uma dotação prevista de quatro milhões de euros, quando deveria ter, este ano, quinze milhões. Ou o da variante Sul do IC2 que tem setecentos mil euros previstos, quando só as expropriações ascendem a sete milhões de euros. A estes casos deve juntar-se o lamentável, mas significativo, exemplo das verbas ridiculas previstas para o avanço do Metro Mondego. É caso para dizer, devagar mas não tanto.
3. Não é garantidamente uma intriga, a reafirmação do Primeiro Ministro na sua teimosia em iniciar a co-incineração de resíduos industriais perigosos em Coimbra. Como muito bem disse Carlos Encarnação, José Sócrates só se lembra da cidade para a provocar, pois, na sua singular ideia, uma terra sem actividade industrial significativa deve ser a única a receber tal lixo. A Câmara Municipal fez bem em recordar que, segundo a lei vigente, a cimenteira carece de autorização para que se proceda à alteração da actividade a que se dedica. E faz bem em deixar claro que recusará essa autorização.
4. Quem nos dera que fosse um boato a decisão de construção na OTA do novo aeroporto de Lisboa. Mas o Governo esclareceu que, dentro de dias, será anunciada a data da apresentação do projecto. Esqueceu-se, no entanto, que tinha prometido divulgar, durante o mês de Outubro, os estudos, ou, pelo menos, o "estudo de cúpula" de tão despropositado empreendimento. Em tempos foi publicado no Público, por Rui Rodrigues, um excelente artigo em que se fazía a evolução comparada dos aeroportos de Lisboa e de Málaga. Essa peça é tanto mais interessante, quanto reforça a minha convicção de que a construção do aeroporto da OTA não tem a sua necessidade minimamente justificada.
5. Entretanto, trata-se certamente de um boato fazer constar que o aeroporto de Lisboa para low-costs vai ser instalado em Beja, Como certamente, não passa de desinformação ou pura intriga, dizer-se que o TGV Lisboa-Porto vai ter 4 (quatro) paragens pelo caminho. Estes casos, em virtude do anonimato das fontes que estão sempre e invariavelmente por detrás dos boatos e das intrigas, não devem merecer o nosso crédito, o que não quer dizer que impliquem a nossa desatenção. É que depois do prefeito da cidade de Bocaiúva do Sul, no Brasil, ter anunciado a construção de um "ovniporto" - aeroporto para ovnis - não sei se valerá a pena tentar descortinar onde começa a intriga, a quem interessa o boato ou a quem serve a insensatez.

Maló de Abreu

Artigo publicado no Diário de Coimbra a 1.11.2005